Microinversor Solar – Como funciona a estratégia de controle
|No artigo anterior, eu fiz uma revisão das três topologias principais de microinversores fotovoltaicos. Agora vamos entender como é feito o controle desses conversores para processar a energia gerada pelo módulo fotovoltaico (FV) e injetá-la na rede elétrica.
O controle do fluxo de potência em um inversor on-grid pode ser feito por meio da tensão ou da corrente de saída, conforme mencionado anteriormente. No primeiro caso, o inversor emula as características de um gerador síncrono para controlar a injeção de potência ativa e reativa na rede elétrica. A desvantagem desse método é que a corrente de saída e a qualidade da energia dependem da qualidade da própria rede [1].
Como existem normas que limitam a distorção harmônica total da corrente injetada na rede, a forma mais comum de controlar o inversor é fazendo com que ele se comporte como uma fonte de corrente [2],[3]. Dessa forma, a corrente é controlada para rastrear uma referência senoidal em fase com a tensão, garantindo assim um fator de potência unitário e o envio exclusivo de potência ativa. Isso também é exigido por norma.
“Tá, Caio! Mas de onde vem essa referência de corrente e onde entra o MPPT nisso tudo?” Calma, é exatamente isso que veremos ao longo deste artigo. Se ficou curioso, me acompanhe até o final. Bora lá!
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A Estratégia de Controle do Microinversor Solar de dois estágios
Nos microinversores de dois estágios, o sistema de controle possui três objetivos principais:
- rastreamento do ponto de máxima potência (MPPT) do módulo FV;
- controle da tensão do barramento CC;
- controle da corrente injetada na rede elétrica.
Estratégia Clássica
A Figura 1 mostra o diagrama de blocos da estratégia de controle tipicamente implementada em microinversores de dois estágios.
1) Controle do Estágio CC-CC
Como podemos ver na referida figura, o MPPT é executado em conjunto com a malha de controle do estágio CC-CC. Nesse caso em específico, o MPPT gera a corrente de referência que é comparada com a corrente do módulo FV. O erro resultante é minimizado por um controlador PI (Proporcional-Integral), por exemplo, e a saída do controlador é usada pelo modulador PWM para comandar os interruptores do conversor. Essa lógica também pode ser implementada a partir da tensão do módulo FV em vez da corrente, com a vantagem de que a tensão é menos influenciada pelas variações na irradiância solar.
2) Controle do Estágio Inversor
No estágio CC-CA existe uma estratégia de controle multi-malhas, na qual a malha externa controla a tensão do barramento CC para estabelecer o balanço de potência no sistema. Observe na Figura 1 que a malha de tensão gera uma amplitude de referência para a malha interna de corrente. Essa amplitude é posteriormente multiplicada por um sinal senoidal unitário fornecido pelo algoritmo de PLL (Phase Locked Loop), resultando em uma referência de corrente alternada e em fase com a tensão da rede. Por fim, a referência de corrente é comparada com a corrente de saída do inversor, e o erro resultante é compensado pelo controlador Gi.
Vale ressaltar que a tensão do barramento CC tende a oscilar diante de variações na irradiância ou na temperatura, devido às mudanças na potência gerada pelo módulo FV. Em consequência, o controlador de tensão (Gv) pede para aumentar ou diminuir a corrente injetada na rede de modo a estabilizar novamente a tensão do barramento CC. Observe também que um filtro Notch é adicionado na realimentação da tensão. Isso porque o controlador Gv, mesmo que minimamente, tenta compensar a oscilação de 120 Hz presente na tensão do barramento. Como resultado, a saída do controlador não é constante e acaba distorcendo a referência de corrente. Por isso, um filtro Notch sintonizado na frequência indesejada de 120 Hz é tipicamente utilizado nesse tipo de aplicação [4].
Atenção!
Outra questão importante é que a malha interna deve ser muito mais rápida do que a malha externa para garantir um desacoplamento dinâmico entre elas e, assim, simplificar o projeto dos controladores [6]. Além disso, um simples controlador PI nem sempre é capaz de garantir uma corrente com baixa distorção harmônica na saída do inversor. Primeiro, porque o PI só garante erro nulo em regime permanente para sinais CC. Segundo, porque o conteúdo harmônico da própria rede pode afetar a malha de corrente. Em razão disso, é comum associar o controlador PI a uma malha de feedforward, ou adotar um controlador P+RES (Proporcional + Ressonante) com compensadores ressonantes em múltiplas frequências [2].
Estratégia baseada nas coordenadas síncronas dq
Na verdade, existe a possibilidade de utilizar o controlador PI e, mesmo assim, garantir erro nulo em regime permanente. Contudo, é necessário implementar o controle de corrente nas coordenadas síncronas dq0, segundo o diagrama de blocos da Figura 2. Geralmente, esse tipo de controle é aplicado em inversores trifásicos, onde a conversão das coordenadas estacionárias abc para as coordenadas síncronas dq0 é feita por meio da transformada de Park. A grande vantagem de se controlar as correntes no plano dq0 é o fato de as grandezas senoidais, com frequência igual à fundamental, serem vistas como sinais constantes ao longo do tempo. Portanto, é possível por meio de um simples controlador PI garantir erro nulo em regime permanente para sinais senoidais na frequência fundamental [2],[7].
Em inversores monofásicos também podemos aplicar a transformada de Park. No entanto, precisamos gerar um sinal fictício defasado em 90º da corrente real, uma vez que a transformada necessita de, pelo menos, dois sinais ortogonais [3]. A outra vantagem dessa técnica é a possibilidade de controlar a potência reativa. Como podemos ver na Figura 2, a componente direta da corrente (Id) controla a potência ativa a partir da malha externa de tensão. Já a componente em quadratura (Iq) controla a potência reativa. Assim, para uma operação com fator de potência unitário, a referência da componente Iq deve ser nula (Iq* = 0).
A Estratégia de Controle do Microinversor Solar com Pseudo Barramento CC
A estratégia de controle aplicada nos microinversores de estágio único se assemelha à dos microinversores com pseudo barramento CC. Por isso, vou me ater apenas aos microinversores com pseudo barramento CC.
1) Malha Externa de Potência
Em geral, o controle utilizado nesse tipo de microinversor solar é muito mais simples do que o do microinversor de dois estágios, discutido acima. Isso porque o estágio inversor opera praticamente em malha aberta na topologia com pseudo barramento CC. Conforme ilustrado na Figura 3, O MPPT em conjunto ao PLL gera uma referência senoidal retificada (Iacref) para a malha interna de corrente. Por isso, podemos dizer que o algoritmo de MPPT serve como uma malha externa de potência, a qual decide a máxima potência que pode ser extraída do módulo FV para uma dada irradiância e temperatura.
2) Malha Interna de Corrente
Assim como no caso anterior, a malha interna deve possuir resposta rápida e uma largura de banda muito maior do que a malha externa de potência, a fim de se obter um desacoplamento dinâmico entre os controles. O controle da corrente também pode ser melhorado com a adição de um feedforward, ou por meio de compensadores ressonantes. Na Figura 3, é possível ver que a malha de feedforward adiciona uma componente (D) à razão cíclica resultante (d) da malha de corrente. Esse esquema coloca o sistema rapidamente no ponto de operação, fazendo que o controlador de corrente (Current Compensator) atue apenas para corrigir o erro.
Como o microinversor referente à aplicação da Figura 3 utiliza um conversor flyback interleaved no estágio primário, existe ainda uma estratégia de controle para garantir o compartilhamento igualitário da corrente entre as células (Load Share Compensator) [9]. Mas, em um conversor convencional, a razão cíclica (d + D) seria aplicada diretamente ao modulador PWM para comandar os interruptores.
Uma vez que a malha interna modula a corrente de saída do conversor primário como uma corrente senoidal retificada, o inversor ponte completa tem o papel de transformar essa corrente retificada em uma corrente alternada para ser injetada na rede. Isso é feito ao se comandar os interruptores do inversor com base na detecção da passagem por zero da tensão da rede.
Conclusão
Este artigo abordou o princípio de funcionamento das estratégias de controle adotadas nos diferentes tipos de microinversores. Com base no exposto, ficou claro que o controle do microinversor solar de estágio único e do microinversor solar com pseudo barramento CC é muito mais simples do que aquele aplicado no microinversor solar de dois estágios. No entanto, este último oferece maior flexibilidade na escolha da estratégia e do tipo dos controladores, além de possibilitar o controle da potência reativa (o que não é possível nas outras topologias).
Se você ficou com alguma dúvida ou tem alguma sugestão para fazer, fique à vontade para deixar seu comentário. Até o próximo artigo!
Referências
[1] PRODANOVIĆ, M.; GREEN, T. C. “Power Quality Improvement in Grid Connection of Three Phase Inverters”, IEEE Power Electronics Machines and Drives 16-18 April 2002, Conference Publication No. 487.
[2] TEODORESCU, R.; LISERRE, M.; RODRÍGUEZ, P. “Grid Converters for Photovoltaic and Wind Power Systems”. John Wiley & Sons, Ltd, 2011. 385 p.
[3] CHATTERJEE, A.; MOHANTY, K. B. “Current control strategies for single phase grid integrated inverters for photovoltaic applications-a review”. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 92, p. 554-569, 2018.
[4] KNABBEN, G. C. “Microinversor Fotovoltaico não Isolado de Dois Estágios”. 2017. 252p. Dissertação de Mestrado em Engenharia Elétrica – Universidade Federal de Santa Cataria, Florianópolis, 2017.
[5] Texas Instruments®. “Digitally Controlled Solar Micro Inverter using C2000™ Piccolo Microcontroller”. [User’s Guide], 2016.
[6] COELHO, R. F.; LAZZARIN, T. B.; MARTINS, D. C. “Modelling and control of the single-phase dc-ac PWM converter for grid-connected applications including a loop for average primary current controlling”. In: XI Brazilian Power Electronics Conference. IEEE, 2011. p. 334-340.
[7] BLAABJERG, F.; TEODORESCU, R.; LISERRE, M.; TIMBUS, A. V. “Overview of Control and Grid Synchronization for Distributed Power Generation Systems”, IEEE Transactions on Industrial Electronics, vol. 53, pp. 1398–1409, Oct 2006.
[8] ATTANASIO, R. “250 W Grid Connected Microinverter”. Application Note AN4070, STMicroelectronics®, 2012.
[9] DUMAIS, A.; KALYANARAMAN, S. “Grid-Connected Solar Microinverter Reference Design”. Application Note AN1444, Microchip®, 2012.